Proposta foi aprovada com apoio da parte da oposição e da base do governo; texto segue agora para o plenário da Casa
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (12) o projeto de lei que legaliza a exploração de jogos e apostas, ou seja, que autoriza o funcionamento de cassinos e bingos no Brasil, legaliza o jogo do bicho e permite apostas em corridas de cavalos. O texto cria a Sistema Nacional de Jogos e Apostas (Sinaj) no Brasil, possibilitando o funcionamento legal dos jogos de azar.
Em tramitação há mais de um ano no colegiado, o texto foi alvo de adiamentos e muitas discussões na CCJ, principalmente por parte dos senadores ligados a segmentos evangélicos. O pastor Silas Malafaia e o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), autor do projeto antiaborto, acompanharam a votação. Eles se sentaram juntos ao lado dos representantes da bancada Evangélica no Senado. Apesar disso, foi aprovado com 14 votos favoráveis e 12 contrários. Agora, vai para o plenário.
Os defensores do projeto – recebeu apoio de líderes do Centrão e da base do governo – conseguiram vencer a resistência, após a bancada religiosa ter perdido força na discussão sobre o projeto antiaborto e audiência pública no plenário do Senado que reuniu bolsonaristas e causou irritação em líderes da Casa. O texto já foi aprovado pela Câmara e segue agora para o plenário do Senado. Um dos promotores do projeto é o ministro do Turismo, Celso Sabino, que prevê geração de emprego e atração de investimento estrangeiro para o país com a aprovação da medida.
O projeto chegou a figurar na lista de medidas que podem compensar a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia e de municípios de até 156 mil habitantes. Essa possibilidade, no entanto, foi descartada pelo líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA). Para ele, a possível arrecadação a ser gerada com a liberação dos jogos é algo a médio e longo prazo.
Os senadores aprovaram o parecer do senador Irajá (PSD-TO) que também permite apostas em corridas de cavalos. A proposta autoriza a instalação de cassinos em polos turísticos ou em complexos integrados de lazer. De acordo com o projeto, “serão admitidas a prática e a exploração no Brasil dos jogos de cassino, de bingo, de videobingo, do bicho, e on-line, bem como das apostas turfísticas (corrida de cavalo)”. Será criada uma agência reguladora, vinculada ao Ministério da Fazenda, para fiscalizar as normas estabelecidas pela nova legislação.
Irajá alegou que atividades como o jogo do bicho já existem no país há anos, mas que vivem na ilegalidade e não arrecadam impostos. Em relação ao vício nos jogos, uma das principais críticas da bancada evangélica, o senador disse ter tomado um cuidado no texto em relação a isso, proibindo empréstimos ou compras a prazo para apostas.
“Tivemos a preocupação e o cuidado de estabelecer o artigo 46, que nenhum brasileiro ou brasileiro possa participar de qualquer modalidade do jogo que não seja através do PIX, do cartão de débito, sendo proibido a participação com cartão de crédito ou que a empresa possa oferecer qualquer tipo de empréstimo ou qualquer modalidade”, disse Irajá.
O projeto também proíbe apostas em espécie e prevê pena para quem permitir. “Nós estamos acostumados a ver, nos filmes de Hollywood, malas de dinheiro para jogar nos cassinos. Isso não existe absolutamente porque o processo é todo eletrônico. Na pessoa física do jogador, nunca na pessoa jurídica, para apostar ou mesmo eventualmente para receber o prêmio. Esse processo tem lastro, é auditável e podendo ser fiscalizado pela Receita Federal, pelos órgãos de controle. Pela Polícia Federal e todos os órgãos competentes”, disse.
O texto passou pela Câmara em fevereiro de 2022 e contou com o empenho pessoal do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), para a aprovação. Da base do governo, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) defendeu a aprovação do projeto e disse que a medida poderia gerar emprego. “Os jogos esportivos, bets, já estavam funcionando, foi legalizado e ainda não foi regulamentado na totalidade, mas vai ser regulamentado. Mas todo mundo está jogando. Eu não estou entendendo por que esta modalidade, que é a modalidade que pode gerar emprego, que pode mobilizar setores da economia, não pode ser regulamentado”, defendeu Carvalho.
Confira os jogos liberados pelo projeto são:
- cassino;
- bingo;
- videobingo;
- jogos on-line;
- jogo do bicho; e
- apostas turfísticas (corridas de cavalos).
O governo federal poderá ainda ditar regras de como poderá funcionar o mercado de jogos e apostas no país, incluindo a fiscalização, que poderá ser feita em acordos com autoridades locais. Para ajudar nessa tarefa, o projeto cria a Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas, com os seguintes valores por trimestre, com atualização da Selic:
- operadores de bingo e entidades turfísticas: R$ 20 mil por estabelecimento;
- jogos on-line: R$ 300 mil por domínio;
- cassinos: R$ 600 mil por estabelecimento;
- jogo do bicho: R$ 20 mil por entidade.
Além disso, os operadores de jogos de azar terão que pagar a chamada Cide-Jogos, uma contribuição de até 17% sobre a receita bruta dos estabelecimentos. A arrecadação do imposto será direcionada principalmente para a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), para a área do esporte e para o Fundo Nacional da Cultura. Além disso, haverá envio de verbas para saúde pública, tratamento de ludopatia (compulsão por jogos de azar), segurança pública, entre outros.
Os prêmios dos apostadores acima de R$ 10 mil também terão a incidência de impostos. Pelo projeto, será cobrado Imposto de Renda de 20% sobre o valor do prêmio, considerando o valor líquido, ou seja, o valor recebido menos a quantia que foi apostado nas últimas 24 horas.
Para impedir o endividamento dos apostadores, as apostas só poderão ser feitas por meio de Pix e cartão de débito. Ou seja, não poderão ser utilizados cartões de créditos ou dinheiro para as operações. As casas de apostas também não poderão oferecer empréstimos aos jogadores.
Segundo o parecer, os jogos de azar movimentam bilhões por ano no Brasil, apesar de não serem legais. De acordo com Irajá, em 2023, a expectativa era de uma movimentação de 14,34 bilhões a R$ 31,5 bilhões. Assim, o senador defende que a atividade teria uma arrecadação em impostos em torno de R$ 20 bilhões por ano e, assim, tem importância econômica e deve ser regulada.
Para Irajá, a legalização de jogos de azar não vai contra a Constituição. De acordo com o senador, o argumento é sobre uma suposta “ofensa à moral e aos bons costumes”, o que ele caracteriza como uma “conceito jurídico indeterminado” e que não pode impedir a regulamentação de uma atividade.
“Ademais, as motivações religiosas eventualmente levantadas não possuem força para se contrapor à regulamentação do tema, uma vez que, como regra, ninguém pode ser privado no País de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política”, defendeu Irajá em seu parecer, citando o artigo 5º da Constituição.
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