Lula vetou a tese do marco temporal, defendida por ruralistas, que prejudica a demarcação de terras indígenas. Contudo, o cenário virou
O Congresso Nacional derrubou, nesta quinta-feira (14/12), o veto 30/2023, que trata sobre o Marco Temporal. Por 374 votos favoráveis e 156 contrários, os parlamentares rejeitaram a medida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto que estabelece a data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988, como limite para demarcação de terras indígenas. Teve uma abstenção.
A sessão começou 10h e ainda segue, com a análise de 39 vetos presidenciais. Nas redes sociais, povos indígenas, movimentos sociais, ambientalistas e ativistas cobraram do Congresso “respeito ao veto”. Contudo, o lobby dos ruralistas em aliança com o amplo espectro do Centrão e da extrema direita derrotou o interesse dos indígenas. Na Câmara, 321 deputados votaram pela derrubada e 137 com o governo. No Senado, 53 a 19. Bolsonaristas comemoraram aos gritos de “surra”.
O Projeto de Lei (PL) 2903/23, apresentado pelo ex-deputado Homero Pereira (MT), foi aprovado pelo Senado em setembro, sob relatoria do senador Marcos Rogério (PL-RO), e seguiu para sanção presidencial. A medida ignora decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 27 de setembro deste ano. A corte declarou inconstitucional o marco temporal e garantiu a proteção aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independentemente de um marco temporal.
Ao chegar ao presidente, Lula vetou 47 dispositivos do PL, entre eles o que estabelecia que os povos indígenas só teriam direito às terras que ocupavam ou reivindicavam em 5 de outubro de 1988. Na justificativa do veto, Lula alegou que o Marco Temporal esbarra na inconstitucionalidade, uma vez que o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia decidido que a data da promulgação da Carta Magna não deveria ser fixada como limite para demarcação dessas terras. Além disso, o chefe do Executivo apontou a dificuldade que os povos indígenas encontrariam em comprovar a data de ocupação dos territórios.
“A proposição legislativa contraria o interesse público por introduzir a exigência de comprovação da ocupação indígena na área pretendida na data da promulgação da Constituição Federal ou então de renitente esbulho persistente até aquela data, desconsiderando a dificuldade material de obter tal comprovação frente à dinâmica de ocupação do território brasileiro e seus impactos sobre a mobilidade e fixação populacional em diferentes áreas geográficas”, argumentou Lula.
Logo após o veto do presidente, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) divulgou uma nota afirmando que iria derrubar a medida. A FPA, presidida pelo deputado Pedro Lupion (PP-PR), é a maior frente do Congresso, com mais de 370 parlamentares membros. Na terça-feira (12/12), Lupion confirmou que o acordo para a derrubada já estava costurado.
Acordo frustrado
O governo abriu mão desse veto para que pudesse ser aprovada a Reforma Tributária. No acordo, a bancada do agro e os governistas concordaram em manter os vetos aos itens 21 e 22, que tratam sobre a reforma e destinação, pela União, de terras indígenas já ocupadas; dos itens 41 ao 43, que tratam sobre o contato com indígenas isolados; e ao item 45, que trata sobre “o cultivo de organismos geneticamente modificados em áreas de unidades de conservação”.
Apesar da manutenção desses itens, a derrubada do veto que fixa a data da promulgação como Marco Temporal causou descontentamento entre os indígenas. A deputada Célia Xakriabá (Psol-MG) e a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, acompanharam a sessão do Congresso nesta manhã e protestaram contra a tese. “Nosso marco é ancestral”, “tiram as mãos das terras indígenas”, “somos parlamentares que assinam direitos, não que retiram”, foram algumas das frases proclamadas.
(Foto: @bellakariri)