Sâmia sobre o fim da CPI do MST: ‘Acharam que iam sair grandes e saíram menores. Um verdadeiro tiro no pé’

Thiago Vilarins – Ficou para esta terça-feira (26) o desfecho dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) . Na última quinta-feira (21) o relator, deputado Ricardo Salles (PL-SP), ex-ministro do Meio Ambiente do governo de Jair Bolsonaro, leu o seu parecer em que pediu o indiciamento de 11 pessoas. Houve pedido de vista conjunto da bancada governista do colegiado, e a votação do relatório ficou para amanhã. Nesta mesma reunião, será apreciado um parecer alternativo com conteúdo bem distinto, apresentado pela deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP). elaborado em conjunto com parlamentares de sua própria bancada com a do PT, bem como com quadros do PSB e do PCdoB.

Os dois documentos previstos para votação não apenas apresentam visões opostas sobre os movimentos sociais rurais, como contam com trocas de acusações entre os respectivos autores (Veja os dois relatórios no fim da matéria). Se no inicio a CPI se mostrava como um front poderoso para desgastar o governo federal, ele se encerra melancolicamente, com uma base bolsonarista completamente constrangida e enfraquecida. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não acatou o pedido de Salles para prorrogar os trabalhos da CPI que, neste momento de aproximação do Palácio do Planalto, viu a comissão como um jogo de cena da bancada bolsonarista para atacar o governo. Lira também atuou para acabar com a CPI: ele cancelou a convocação do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa. Ele argumentou que a convocação de Costa não tinha relação com o objeto de investigação do colegiado.

Para piorar, na última semana, União Brasil, MDB, PP e Republicanos trocaram membros do colegiado, tirando bolsonaristas e colocando parlamentares mais neutros. Com isso, foi esvaziado o discurso da oposição e nas últimas sessões a direção da CPI sequer conseguiu aprovar requerimentos sensíveis ao governo federal. Do outro lado, a posição tomada por PT e PSOL deve abranger também os parlamentares das siglas PSB e PCdoB, que jogam juntos na maior parte das votações da Casa – não se sabe ao certo quantos votos os governistas vão arregimentar na votação do parecer, uma vez que a base parlamentar da gestão Lula no Congresso Nacional é instável.

Para Sâmia Bomfim, que foi uma das integrantes mais combativas da CPI, e consequentemente, uma das mais atacada pelas bancadas ruralista e bolsonarista, o último capítulo revela um desfecho muito melancólico para aqueles que planejaram dizimar a imagem do MST e de sair bem maiores politicamente ao fim deste trabalho. “É um fim melancólico mesmo  para a ala bolsonarista. Eles começaram agitando que acabariam com o movimento social, que indiciariam, criminalizariam todo mundo e estão acabando sem número suficiente de votos para aprovar um relatório, que já é rebaixado. Vários abusos que foram cometidos e depois foram suspensos pelo Supremo Tribunal Federal, o próprio presidente da Câmara (Arthur Lira), que não é um aliado do movimento, mas que também entrou em cena e virou as costas quando a CPI acabou se tornando um palco para tentar desgastar o governo Lula”, avalia Sâmia Bomfim ao Opinião em Pauta.

“Acho que a gente fez um bom trabalho de resistir nestes meses todos e, agora, aqueles que achavam que iam sair grandes da CPI, estão saindo pequenos, minúsculos. E, ao contrário, o MST nunca esteve tão na boca do povo positivamente. Muita gente me para na rua pra dizer: ‘agradeço a sua participação na CPI, porque agora eu sei o que é o movimento social, o papel que eles tiveram nos assentamentos, na reforma agrária, na política de acesso a alimentos, no desenvolvimento de outras políticas públicas’. Então, eu classifico como um verdadeiro tiro no pé”, acrescentou.

A reportagem do Opinião em Pauta conversou com a deputada Sâmia Bomfim na última quinta-feira (21), horas antes dela ser agraciada como a melhor parlamentar do país, tanto na votação popular quanto na escolha dos jornalistas que cobrem o Legislativo, no Prêmio Congresso em Foco, principal premiação da política brasileira. Confira a entrevista exclusiva:

 

A CPI do MST chega ao fim esta semana esvaziada politicamente, sem pedido de prorrogação dos trabalhos, e com um relatório criminalizando o movimento que nem deve ser aprovado pelo colegiado. Como a senhora classifica esse fim da CPI?

Sem dúvida, é um fim melancólico mesmo  para a ala bolsonarista. Eles começaram agitando que acabariam com o movimento social, que indiciariam, criminalizariam todo mundo e estão acabando sem número suficiente de votos para aprovar um relatório, que já é rebaixado. Vários abusos que foram cometidos e depois foram suspensos pelo Supremo Tribunal Federal, o próprio presidente da Câmara, que não é um aliado do movimento, mas que também entrou em cena (para acabar) quando a CPI acabou se tornando um palco para tentar desgastar o governo Lula. Então, acho que a gente fez um bom trabalho de resistir nestes meses todos e, agora, aqueles que achavam que iam sair grandes da CPI, estão saindo pequenos, minúsculos. E, ao contrário, o MST nunca esteve tão na boca do povo positivamente. Muita gente me para na rua pra dizer: ‘agradeço a sua participação na CPI, porque agora eu sei o que é o movimento social, o papel que eles tiveram nos assentamentos, na reforma agrária, na política de acesso a alimentos, no desenvolvimento de outras políticas públicas’. Então, eu classifico como um verdadeiro tiro no pé.

 

Na sua opinião, o que causou este desgaste da CPI? As reuniões que ficaram concentradas em embates entre a maioria bolsonarista contra as deputadas governistas, principalmente a senhora que foi a maior vítima dos ataques misóginos, também ajudaram para este fim melancólico?   

Eu acho que foi uma combinação de fatores. Primeiro, acho que a inexperiência do presidente (deputado Zucco – Republicanos/RS), muito atrapalhado, autoritário, então ele acabou colocando os pés pelas mãos em muitos momentos, quando ele só pautava os interesses dos bolsonaristas e não respeitava o direito de minoria. Quando cometeram excessos nas diligências, violência contra os acampados, contra os assentados. Claro, a violência política de gênero que foi uma marca de todos os dias da sessão. E, também, os convidados que eles trouxeram, ex-integrantes do movimento ou supostamente ex-integrantes era um jogo de cartas marcadas. Muitas vezes, um teatro comovente, mas com pouca materialidade, nenhuma prova de nenhuma das acusações. Serviu, talvez, para base bolsonarista mais fanática. Aplaudir, fazer palanque. Mas, para a sociedade, para o setor amplo que está em disputa, não teve esse efeito. Acho que serviu mais para desmoralização deles, muitas vezes por conta dos próprios erros, mas também por uma atuação contundente que nós fizemos.

 

Foi uma grande perda de tempo de trabalho legislativo?

E de dinheiro público, principalmente. A gente já fez um requerimento para saber quanto foi gasto nessas diligências e, até agora, a gente não teve essa informação. Provavelmente, a gente deve judicializar, porque é importante que essa cidade saiba que uma diligência como essa, com carros da Polícia Federal, milhares de servidores, passagens aérea, todo um espetáculo para não entregar nada pra sociedade. Eles também precisam prestar contas disso.

 

Com esse requerimento vocês querem mostrar que a CPI foi um circo armado pela oposição para tentar fragilizar o governo?

Que foi um grande gasto público usado para uma grande perda de tempo. Para construir um palanque bolsonarista que não teve efeito nenhum, não serviu para provar nada, completamente inútil pra sociedade. Talvez, serviu pra alguns likes desses parlamentares, mas não justifica toda a estrutura pública gasta em nome de meia dúzia de gente que quer um palanque.

 

Confira os dois relatórios finais

Sâmia Bomfim aqui

Ricardo Salles aqui

 

(Foto: Divulgação)

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