Governadores defendem reforma tributária, mas apontam divergências

Senado recebeu governadores e vice-governadores para debater a PEC 45/2019. Os principais pontos foram a formação do Conselho Federativo e o Fundo de Desenvolvimento Regional

 

Governadores e vice-governadores debateram na terça-feira (29), no Senado Federal, a proposta de emenda à Constituição (PEC 45/2019), que trata da reforma tributária. A sessão foi convocada pelo senador Jorge Kajuru (PSB-GO) e teve como base o projeto aprovado na Câmara dos Deputados. A principal novidade da reforma é a substituição de cinco impostos, PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS por um IVA Dual de padrão internacional, composto pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), federal, e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), subnacional (de estados e municípios). Dessa forma a CBS substitui PIS, Cofins, IPI (federais) e o IBS substitui ICMS (estadual) e o ISS (municipal).

Um ponto comum entre a maioria dos senadores e dos presentes no debate é de que a reforma tributária é necessária, no entanto muitos governadores pedem por aperfeiçoamento e clareza, pois temem perda de receitas com o resenho proposto. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), abriu a sessão, classificada por ele como momento histórico, e ressaltou que, mesmo havendo previsão de votação da PEC para o início de outubro, a prioridade é fazer uma discussão ampla e profunda da matéria. Segundo ele, “nada será feito de modo açodado”.

“Este é um momento histórico, porque o Congresso Nacional reúne sob seu teto, num único evento, os governadores de todas as unidades federativas de nosso país. Ao fazê-lo, estamos abrindo nossas portas para um diálogo franco sobre a reforma tributária, que tanto desejamos e da qual tanto necessitamos. É um momento do qual se orgulhariam grandes nomes da política brasileira, como Juscelino Kubitschek, Ulisses Guimarães, Teotônio Vilela, Mário Covas — apenas para citar alguns entre os muitos homens públicos que foram mestres na arte de dialogar e de fazer política em nosso país”, disse.

O secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para a reforma tributária, Bernardo Appy, falou antes dos governadores, apresentou dados sobre o trabalho realizado e lembrou da recente pesquisa do IPEA que mostra que a grande maioria de estados e municípios irá ganhar com a reforma. “Nenhum estado e um número muito pequeno de municípios terá redução real de receita ao longo de 50 anos em função desse modelo que está sendo adotado. E no caso desses poucos municípios, são municípios que têm hoje uma receita per capita muito mais alta do que a receita per capita média do país […] e essa é uma receita que está sendo corrigida dentro do modelo que está sendo apresentado”, explicou. Ele também observou que o Fundo de Desenvolvimento Regional (FNDR) irá auxiliar a reduzir as desigualdades regionais no período de transição, porém que a distribuição tem caráter mais político do que técnico. (Veja abaixo a tabela apresentada pelo secretário quanto aos recursos do FNDR).

Estiveram presentes na ocasião, ao menos, 19 representantes dos estados entre governadores e vice-governadores. O governador de Alagoas, Paulo Dantas, defendeu que os estados do Norte e no Nordeste tenham maior participação do Fundo de Desenvolvimento Regional e que o período de transição da reforma seja reduzido, assim como o valor do fundo deve ser elevado. “O entendimento entre todos os governadores é alcançarmos o valor de 75 bilhões de reais [para o FDR]. O critério de rateio e partilha é fundamental para diminuirmos desigualdades sociais e alcançarmos as pessoas mais humildes, sobretudo no Norte no Nordeste. Então o critério tem que ser inversamente proporcional ao PIB ou se utilizar o mesmo critério do Fundo de participação dos estados, e esse critério não [deve] ser definido por lei complementar e sim por emenda constitucional. Sobre a transição, estamos trabalhando e querendo o apoio para reduzimos o prazo de transição de 50 para 26 anos para que esses benefícios tenham condição de chegar às pessoas o mais rápido possível”, disse Dantas.

A configuração e o funcionamento do Conselho Federativo a ser criado pela reforma tributária, com a função de gerir a distribuição do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), foi um dos pontos mais debatidos. O Conselho deverá ser formando pelos entes federativos, composto por 27 membros representando cada Estado e o Distrito Federal (DF) e 27 membros representando o conjunto dos municípios e o DF. No entanto o tema levanta dúvidas, pois muitos governadores acreditam na formação de blocos regionais que se uniriam para ter maioria de decisão sobre o imposto.

“A ideia do conselho, filosoficamente falando, é muito importante, mas, se é um conselho da Federação, os entes federados precisam se sentir representados, e se sentir representados como unidades da Federação, porque, se nós tivermos um conselho em que haja uma hegemonia de uma região sobre a outra, nós perdemos todos os princípios, de cara, da Federação brasileira, do federalismo. Então, nós apoiamos a reforma, achamos que ela é importante, é necessária, precisa cumprir alguns objetivos muito importantes há tempos inclusive, mas esse conselho precisa representar a Federação”, ponderou o governador do Amapá, Clécio Luis (SD).

Visão do relator

O senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator da PEC 45/2019, repassou sobre os pontos tocados nas dezenas de falas no plenário. Antes destacou o mérito da decisão da Câmara e disse que “a reforma tributária não é do governo, é uma reforma de Estado, daí a importância da transição para além de governos, para além de mandatos”. Sobre os pontos levantados por oposicionistas ao governo Lula, como os feitos pelo senador Rogério Marinho (PL), Braga ironizou:

“A respeito do pronunciamento ainda pouco feito pelo líder de oposição senador Rogério Marinho, ouvindo o seu discurso nos parece que o Brasil tem um sistema tributário que não precisa ser reformado, quando na realidade estamos discutindo há 40 anos a reforma do sistema tributário brasileiro, porque representa um manicômio tributário. É tão desorganizado, é tão complexo que cria custos que praticamente inviabilizam a competitividade do produto industrial brasileiro. Não é à toa que a indústria brasileira nos últimos 20 anos vem perdendo competitividade e vem perdendo participação no PIB”, salientou.

Sobre a discussão, o relator entende que o modelo de desenvolvimento do Brasil talvez migre do incentivo tributário para o incentivo orçamentário financeiro. Nesse aspecto é onde se insere o debate feito não só pelo Congresso, mas com toda a sociedade, especialmente pelo setor produtivo, e o tamanho do Fundo de Desenvolvimento Regional diz respeito diretamente a isto. “A questão do tamanho Fundo de Desenvolvimento Regional que foi colocado aqui quase que pela unanimidade dos estados é de que R$ 40 bilhões é um lençol curto em relação à demanda que acontecerá ao longo do tempo”, disse.

Sobre a divisão do fundo, Braga observou que o tema é um dos que mais interessa aos governadores e que o caminho será definido pelo debate. “De forma quase que unânime os critérios de como vai se estabelecer a distribuição do Fundo de desenvolvimento regional também se colocou, mas todos no sentido de encontrar um caminho para uma solução daquele texto que veio da Câmara para o Senado, tirando uma colocação ou outra de um governador que tem uma visão completamente diferente do modelo proposto. A Democracia é isso! A discussão é exatamente das opiniões positivas da forma como estamos tratando, no nível de amadurecimento democrático que estamos tratando aqui no Senado”, reforçou o senador. Na questão do Conselho Federativo, indicou que irá trabalhar para que “o formato tenha as garantias que precisamos dar aos Estados e aos municípios para que possa funcionar como um órgão técnico administrativo”.

(Foto: Roque de Sá/Agência Senado)

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