Tudo o que se pensar do ex-governo Bolsonaro como modus operandi suspeito, é pouco.
A cada dia surgem revelações dramáticas do desastroso desgoverno de perfil ultradireitista que desestruturou toda a base de governança baseada em inspirações democráticas, para seguir uma linha de perseguições e ameaças a adversários.
É o que se toma conhecimento agora através de matéria publicada em O Globo a respeito de um programa de espionagem, usado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), para rastrear brasileiros.
O programa consistia em um sistema secreto para monitorar a localização de cidadãos, por meio de dados do celular.
A arapongagem da Abin foi colocada em prática durante os três primeiros anos do governo de Jair Bolsonaro (PL).
Explica a reportagem de O Globo que, na prática, “qualquer celular dentro do país poderia ser monitorado e sem justificativa oficial”.
A ação gerou questionamentos dentro do próprio órgão e um procedimento interno foi aberto para apurar os critérios de uso da ferramenta tecnológica.
Segundo a reportagem, que teve acesso a documentos e ouviu os relatos de servidores, o programa teria sido usado até mesmo contra agentes da própria Abin.
Tecnologia israelense
A tecnologia embarcada no equipamento é de origem israelense.
Denominada “FirstMile”, a ferramenta permite monitorar os passos de até 10 mil pessoas a cada 12 meses.
“O rastreio é simples e para ativar basta digitar o número do contato telefônico. A partir disso, o acompanhamento é feito por meio de um mapa”, diz a matéria.
O programa ainda permite a criação de um histórico de deslocamentos e “alertas em tempo real” da movimentação de um alvo específico em um determinado local.
O software desenvolvido pela empresa israelense Cognyte, foi comprado por R$ 5,7 milhões – com dispensa de licitação – no final do governo Michel Temer (MDB).
De acordo com O Globo, a ferramenta foi usada pelo governo Bolsonaro até meados de 2021.
Ainda de acordo com o jornal, um integrante do alto escalão da Abin afirmou, sob condição de anonimato, que o sistema podia ser usado “sem controle” e que não era possível identificar acessos indevidos.
A prática foi questionada por agentes da própria Abin, tendo em vista que a agência não possui autorização legal para acessar livremente dados privados da população.
Neste cenário, sem justificativa oficial, a ferramenta era utilizada sob a alegação de que o acesso a metadados do celular não estava expressamente proibido na legislação brasileira.
A partir disso, a Abin de Bolsonaro operava a ferramenta alegando “segurança do Estado”.
O jornal afirma na reportagem que a Abin foi procurada para dar sua versão, e respondeu dizendo que “devido ao sigilo contratual está impedida de comentar o caso”.
O mesmo argumento foi usado pela empresa que desenvolveu o programa e pelo seu representante no Brasil, Caio Cruz, filho do general Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro.
A Abin atuava jurisdicionada ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), então comandada pelo general Augusto Heleno (foto acima ao lado de Bolsonaro).
Para combater as práticas predadoras da gestão anterior e acabar a vertente de polícia política disseminada nos anos de governo Bolsonaro, o presidente Lula determinou, logo nos primeiros dias de seu terceiro governo, passar a Abin para a jurisdição da Casa Civil. ( Foto Carolina Antunes / Palácio do Planalto)