O governo dos Estados Unidos negou a extradição dos pilotos que conduziam o jato Legacy no momento em que ele se chocou contra um avião da Gol e o derrubou, em 2006.
Os americanos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino foram condenados pela Justiça brasileira por terem provocado do acidente, que deixou 154 mortos. Os dois conseguiram fazer um pouso de emergência e saíram ilesos.
O governo americano confirmou a recusa em 5 de maio, conforme informou ao GLOBO o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Justiça.
“Embaixada dos EUA transmitiu informação de que o Governo daquele país não deu seguimento ao pedido por entender que os crimes não encontram amparo no Tratado Bilateral de Extradição entre Brasil e EUA”, diz o comunicado.
O pedido de extradição foi feito em 13 de novembro de 2019, em nome da 1ª Vara Federal de Sinop, em Mato Grosso. O juiz responsável pelo caso já foi informado da decisão.
O voo 1907 da Gol fazia o trajeto Manaus-Brasília, tendo o Rio como destino final. Atingido pelo Legacy, caiu no Norte do Mato Grosso, a 692 km de Cuiabá, na reserva indígena do Xingu, já na divisa com o Pará.
A Justiça Federal analisou que infrações cometidas por Lepore e Paladino foram determinantes para o acidente e pediu a prisão dos dois, condenados a três anos de prisão em regime aberto.
Não cabe recurso contra a condenação desde 2015. Na época, o Ministério da Justiça brasileiro emitiu uma intimação, mas o Departamento de Justiça americano afirmou não haver jurisdição para aplicar a sentença.
Relembre o caso
Na maior tragédia da aviação brasileira até então, no fim da tarde de 29 de setembro de 2006, uma sexta-feira, o jato da empresa Excel Air pilotado por Paladino e Lepore bateu na asa esquerda do Boeing 737-800.
Após quase 24 horas de buscas, os destroços da aeronave foram encontrados numa área de mata fechada da Floresta Amazônica.
Na colisão, o Legacy (fabricado pela Embraer) teve parte de uma das asas e a cauda danificadas, mas conseguiu fazer um pouso de emergência num campo de provas da Força Aérea Brasileira (FAB), na região de Alta Floresta.
Entre as vítimas da tragédia, estava um bebê de 11 meses que viajava com a mãe. No avião também estavam outras quatro crianças, de até 12 anos, dois cientistas da Fundação Oswaldo Cruz, médicos, funcionários do Inmetro e um grupo de amigos capixabas que viajaram para pescar.
Noticiada por sites, jornais e TVs de todo o mundo, a tragédia ficou quase cinco anos sem qualquer punição. Somente em maio de 2011, os pilotos americanos foram condenados, pela Justiça de primeira instância, a quatro anos e quatro meses de detenção, por crime culposo (sem a intenção de matar) contra a segurança do transporte aéreo.
O juiz federal Murilo Mendes, de Mato Grosso, decidiu que a pena deveria ser substituída por prestação de serviços comunitários em órgãos brasileiros nos Estados Unidos.
O Ministério Público Federal e a Associação dos Familiares e Amigos das Vítimas do Voo 1907 da Gol entraram com recurso contra a decisão. A pena foi reduzida para três anos, um mês e dez dias, em regime aberto, por decisão do Tribunal Regional Federal, em 15 de outubro de 2015.
O que causou o acidente
Segundo o magistrado, os pilotos foram negligentes ao não observarem o funcionamento do transponder (equipamento que transmite dados como velocidade, direção e altitude do avião, alertando sobre possível choque com objetos, e altera automaticamente a rota da aeronave) e do TCAS (dá informações ao piloto sobre outros aviões nas proximidades).
Relatório da Aeronáutica concluiu que a hipótese mais provável foi o desligamento do transponder pelos pilotos, de forma não intencional. O relatório também constatou várias falhas dos controladores de voo na tragédia.
Em 2010, a Justiça Militar condenou o sargento e controlador de voo Jomarcelo Fernandes dos Santos a um ano e dois meses de detenção por causa do acidente com o voo 1907 da Gol e o Legacy. Ele respondeu por homicídio culposo – sem intenção de matar. Jomarcelo foi acusado de não informar sobre o desligamento do sinal anticolisão do Legacy e por não ter avisado o oficial que o substituiu no controle aéreo sobre a mudança de altitude do jato. Outros quatro controladores – João Batista da Silva, Felipe Santos Reis, Lucivando Tibúrcio de Alencar e Leandro José Santos de Barros – foram absolvidos.
Na imagem, Boeing 737 da Gol após queda em 2006 (Foto: Divulgação/FAB)