Por Henrique Acker – O dia 19 de novembro de 2024 marcou os 1000 dias da guerra na Ucrânia. Um conflito que começou muito antes de 2022, culminando com a invasão russa do país vizinho. Nessa matéria, lembramos os principais acontecimentos que envolvem o embate entre a maior superpotência nuclear do planeta e a Ucrânia, apoiada pela Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN, que reúne os EUA e seus aliados europeus.
. Fevereiro de 2014 – Após uma série de manifestações populares que exigiam a entrada da Ucrânia para a União Europeia, setores ultranacionalistas decidiram depor o presidente eleito Viktor Yanukovych, aliado da Rússia e acusado de corrupção. Os acontecimentos da Praça Maidan, no Centro de Kiev, representaram uma ruptura da Ucrânia com o vizinho, até então seu maior parceiro econômico.
. Anexação da Criméia – Ponto comercial estratégico no Mar Negro e acesso marítimo para o Mediterrâneo e o Ocidente, a Criméia esteve por séculos nas mãos da Rússia. Logo que o regime de Yanukovych caiu, o governo de Vladimir Putin promoveu um plebiscito pela reanexação do território à Rússia. A consulta, contestada pelo Ocidente, foi amplamente favorável aos propósitos de Moscou.
. Limpeza étnica no Donbass – O governo que assumiu em Kiev, igualmente corrupto, não conseguiu a adesão do país à União Europeia, mas obteve apoio imediato da UE e dos EUA. Uma das medidas que precipitou o embate com Moscou foi a ofensiva política, cultural e militar contra as repúblicas de Donetsk e Lugansk (região conhecida como Donbass), a partir de 2019, na fronteira com a Rússia, onde se concentram majoritariamente populações de origem russa. Cerca de 14 mil pessoas morreram até 2022 na região.
. Adesão à OTAN – Uma das bandeiras do governo de Kiev passou a ser o ingresso do país na Organização do Tratado do Atlântico Norte, a aliança militar comandada pelos EUA e pela Europa Ocidental. Putin já havia alertado que não aceitaria tropas e armas da OTAN na fronteira, lembrando que os acordos entre Reagan e Gorbatchev – que levaram ao desmantelamento da URSS – previam que a OTAN jamais se aproximaria do território russo.
. Sabotagem ao gasoduto Nordstream – Até hoje, as investigações na Europa sobre a explosão do gasoduto que ligava diretamente a Rússia à Alemanha seguem em sigilo. Mas o fato é que o próprio Joe Biden afirmou, em janeiro de 2022, que os EUA não permitiriam a continuidade da operação do Nordstream. “Não haverá mais um Nord Stream 2, vamos colocar fim a isso”, afirmou Biden em entrevista coletiva na Casa Branca.
. Invasão e fracasso na negociação – Em abril de 2022, com as tropas de Moscou já nas proximidades de Kiev e em ofensiva no Donbass, a Turquia sediou um processo de negociação entre Ucrânia e Rússia. Na ocasião, Putin exigia garantias de que a Ucrânia não entraria para a OTAN e não haveria armas e tropas daquela Organização na fronteira com a Rússia. As conversas produziram um rascunho de documento com as condições para a paz. No entanto, sob orientação de Washington, o primeiro-ministro da Inglaterra, Boris Johnson, garantiu aos ucranianos que a OTAN daria todo o apoio militar necessário contra os russos.
. Sanções econômicas – A União Europeia passou a adotar represálias econômicas e comerciais contra o governo de Putin. Entre elas, a proibição de compra do petróleo e gás da Rússia. Essas sanções tiveram pouco efeito prático, visto que a Rússia passou a vender petróleo e gás para a China e Índia. Mas fizeram disparar os preços dos combustíveis no segundo semestre de 2022, o que gerou inflação de cerca de 10% ao ano na Europa, atingindo sobretudo a economia alemã, muito afetada pelo corte do fornecimento de gás russo.
. Ofensiva ucraniana – Na primavera de 2023, o governo de Kiev montou uma contra-ofensiva militar no Donbass. A operação durou até o final do verão e não gerou os resultados esperados de retomada de territórios, mantendo o impasse entre tropas dos dois países no terreno de guerra. A Rússia aproveitou o inverno para reformular e modernizar seus equipamentos e Putin para limpar suas tropas de oficiais indesejados e dos mercenários do Grupo Wagner.
. Plano de Vitória – Em junho de 2024, Vlodomyr Zelenski convocou um encontro de cúpula pela paz, na Suíça, sem convidar a Rússia. A repercussão ficou aquém do esperado, mas Zelenski prometeu apresentar um plano de paz para discutir com Joe Biden e a UE antes da eleição presidencial nos EUA. O chamado “Plano de Vitória” nasceu morto, porque além de não ceder nada aos russos, propõe a punição dos governantes do país agressor.
. Contra-ataque frustrado – Para contra-atacar, o governo ucraniano lançou uma ofensiva militar na região russa de Kursk, em agosto de 2024, o que fragilizou ainda mais seu controle sobre o Donbass, de onde foram deslocadas tropas. A ofensiva ucraniana não obteve sucesso e as tropas russas seguem avançando nos territórios de Lugansk e Donetsk.
. Efeito Trump – A nova eleição de Donald Trump – que prometeu acabar com a guerra em um dia – estabeleceu um prazo até 20 de janeiro de 2025 (posse do novo governo dos EUA) para a Ucrânia negociar a paz em melhores condições. A solução de Zelenski foi pressionar a Europa e Biden a permitir o uso de mísseis de médio e longo alcance contra território russo. O argumento usado é o alegado engajamento de tropas da Coreia do Norte, que estariam prontas a combater ao lado dos russos. Seguiu-se a isso a publicação da nova doutrina militar russa, que prevê a possibilidade de uso de armas nucleares em resposta a qualquer ataque de armas convencionais contra seu território.
Números da guerra da Ucrânia:
Mortos e feridos (sem contar civis)
. 70.112 soldados russos mortos (cerca de 20% ou 13.781 eram voluntários, outros 19% ex-prisioneiros e 13% convocados, conhecidos como cidadãos recrutados). Os dados são da BBC News Russia, o serviço de notícias em russo da BBC, e do site independente Mediazona, obtidos a partir de outras fontes abertas publicadas, incluindo relatórios oficiais.
. Apesar do governo de Kiev informar em fevereiro deste ano que 31 mil ucranianos morreram em combates, fontes ocidentais estimam em cerca de 80 mil o número de soldados ucranianos que perderam suas vidas até aqui.
. Em agosto de 2023, o jornal New York Times, citando fontes norte-americanas, estimou as perdas militares em 70 mil mortos e entre 100 mil e 120 mil feridos no lado ucraniano, e 120 mil a 170 mil mortos e 170 mil a 180 mil feridos no lado russo.
Refugiados e deslocados
De acordo com a agência da ONU para refugiados Acnur, até o momento, 6,7 milhões de refugiados ucranianos encontraram abrigo em países europeus, e outros 400 mil chegaram a esses países somente no primeiro semestre de 2024.
Ajuda militar e financeira dos EUA e UE
Do início da guerra, em 24 de fevereiro de 2022, até o fim de agosto de 2024, os EUA forneceram ajuda no valor de quase 85 bilhões de euros. A ajuda da UE e de seus estados-membros totalizou pouco mais de 100 bilhões de euros durante esse período. Fonte: Instituto econômico IFW, de Kiel.
Recuperação da Ucrânia no pós-guerra
. A última Avaliação dos Danos e das Necessidades da Ucrânia (dezembro/2023) refere que o custo total para a recuperação do país aumentou para 486 bilhões de dólares. O documento é publicado pelo governo da Ucrânia, Banco Mundial, Comissão Europeia e Nações Unidas.
Por Henrique Acker (correspondente internacional)
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Fontes: