Henrique Acker (correspondente internacional) – Em 7 de outubro de 2023 centenas de membros das brigadas Al Qassam, braço armado do movimento de resistência palestina Hamas, romperam as grades que separam a Faixa de Gaza de territórios ocupados por Israel.
Com motocicletas, camionetes e até parapentes, os insurgentes palestinos atacaram as os postos de segurança, algumas comunidades israelenses e um festival de música que se realizava nas proximidades.
Como resultado da ofensiva 1.200 pessoas foram mortas e 251 foram feitas prisioneiros, levadas para Gaza. Cerca de 300 mortos eram soldados e policiais israelenses. Parte das mortes é atribuída a contra-ataques de helicópteros israelenses.
Logo o governo dos EUA e a cúpula da União Europeia declararam o direito de Israel a “se defender”.
Quanto mais guerra melhor
O ataque de 7 de outubro de 2023 foi uma tentativa do Hamas de romper o silêncio da comunidade internacional ao cerco de Gaza por Israel e a questão palestina. O desrespeito e a ofensiva da extrema-direita israelense contra a mesquita sagrada de Al-Aqsa, em Jerusalém, foi também um dos motivos alegados para lançar o ataque.
Os dirigentes do Hamas sabiam que haveria uma reação do governo israelense. Gaza já havia sido atacada e bombardeada por quatro oportunidades desde 2001. Mas o Hamas não contava com uma resposta tão violenta.
Benjamin Netanyahu declarou guerra e afirmou que entre seus objetivos estaria destruir o Hamas. O primeiro-ministro precisa ganhar tempo, visto que está sendo processado por corrupção, fraude, quebra de confiança e suborno. Enquanto Israel estiver em guerra, o governo não pode ser dissolvido.
Estrangulamento de Gaza
Apoiado por partidos de extrema-direita que participam de seu governo, Netanyahu anunciou um estrangulamento da população civil de Gaza. Dois dias após o início da guerra, o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, disse haver ordenado um “cerco completo” à Faixa de Gaza.
“Não haverá eletricidade, nem comida, nem combustível, tudo está fechado… Estamos lutando contra animais humanos e estamos agindo de acordo”, declarou Gallant. Passado um ano, os dados do genocídio em Gaza são assustadores (*)
Os prisioneiros israelenses e o drama de seus familiares foram relegados a segundo plano. Ao mesmo tempo que acusa o Hamas de usar a população palestina de escudo para suas ações, o governo israelense usa os reféns para justificar o bombardeio incessante a Gaza.
O importante para Netanyahu é manter as tropas israelenses em combate, o que lhe assegura a manutenção do poder e a liberdade. A única força capaz de desafiar Netanyahu e a extrema-direita israelense parece estar concentrada na luta dos familiares e amigos dos sequestrados, que semanalmente promovem manifestações pela paz e negociação para a libertação dos reféns.
Netanyahu sem limites
Em setembro de 2020 os governos de Israel e dos Emirados Árabes Unidos (EAU) assinaram o que ficou conhecido como Acordos de Abraão. O tratado de paz e normalização das relações diplomáticas entre os dois países foi patrocinado pela administração Donald Trump.
A Autoridade Nacional Palestina e o Hamas rejeitaram e denunciaram os Acordos de Abraão como traição e uma atitude “vergonhosa” do governo dos EAU. O tratado foi interpretado como uma tentativa do governo estadunidense de isolar o Irã e os xiitas no Oriente Médio.
Dizia-se, à época, que o governo de Israel abriria mão definitivamente dos planos de anexar os territórios palestinos ocupados na Cisjordânia. Mas nada mudou dali em diante.
Ao contrário, palestinos continuaram a ser expulsos de suas terras, novas colônias de judeus fundamentalistas foram criadas e a Cisjordânia segue ocupada por tropas de Israel.
O presidente Biden anunciou que Israel receberia reconhecimento diplomático total da Arábia Saudita, o país islâmico sunita mais influente, em troca de permitir a independência palestina. Os sauditas seriam recompensados com um pacto de segurança com os EUA. Nada disso foi adiante. Nem os EUA querem frear Israel, nem Netanyahu aceita limites.
Risco de um conflito generalizado
O líder do Hamas, Yahya Sinwar, que estaria em algum lugar em Gaza, também alimentava ilusões. Ele esperava que o resto do chamado “eixo de resistência”, tendo a frente o Irã, se unisse numa guerra para paralisar Israel. Estava errado. Até aqui a resposta iraniana a Israel tem sido pontual e proporcional.
De 7 de outubro de 2023 em diante o que se vê é um genocídio, em que as tropas israelenses massacram a população palestina diariamente, destruindo toda a infraestrutura da Faixa de Gaza.
Em resposta aos ataques do Hezbollah a instalações militares ao norte de seu território, Israel lançou novo ataque ao Líbano, incluindo a capital, Beirute. Já são mais de dois mil mortos e nove mil feridos no Líbano, e mais de um milhão de deslocados.
O conflito conta ainda com confrontos esporádicos entre Israel e os Houtis, no Iêmen, e grupos armados do Iraque, novas incursões israelenses na Cisjordânia e ataques entre Israel e o Irã. É difícil afirmar, mas as investidas de Israel e as respostas dos grupos armados xiitas podem levar o Oriente Médio a uma guerra generalizada no Oriente Médio.
Impacto sobre o petróleo
Um sintoma do grau de tensão é que mais tropas e equipamentos militares estadunidenses foram deslocados nos últimos dias para a região e 13 bilhões de dólares foram aprovados pelo Congresso dos EUA (com o voto de democratas e republicanos), a pedido do governo Biden, para manter a assistência militar a Israel.
Uma guerra de maior fôlego envolvendo países e grupos armados no Oriente Médio teria consequências imediatas no preço do petróleo. Até aqui, apesar da guerra da Ucrânia, o preço médio do barril tem se mantido entre 68,6 e 93,7 dólares nos últimos 12 meses.
Isso porque a Rússia passou a exportar mais barato para a China e a Índia, que acaba por abastecer países que antes compravam o produto diretamente da Rússia. Mas é preciso levar em conta que cinco dos dez maiores produtores de petróleo do mundo (Arábia Saudita, Iraque, Irã, Emirados Árabes Unidos e Kuwait).
Por Henrique Acker (correspondente internacional)
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Fontes:
Wikipédia – Tratado de paz entre Israel e os Emirados Árabes Unidos
Universidade de Coimbra – A legítima defesa no moderno direito internacional